Os ventos confusos rodopiam ao meu redor, acariciando-me com dedos gélidos e hálito cálido. Buscam em minhas páginas o brilho de um rei apaixonado, clamam pelas lágrimas à face de uma rainha. Vagueiam perdidos pelos prados verdejantes, cegos, confusos, desejosos de linhas escritas. Mas, nem só de tristezas se alimentam. Desejam encontrar magia, vidas, fantasias.
Trêmulos ficam com o silêncio crescente, como crianças a buscar o abraço da mãe. Temem a sombra cada vez mais envolvente, desejando a proteção dos braços do pai.
Gritam, lamuriam, fechando os olhos fortemente, não mais querendo garras em seus corações.
Clamam, imploram debilmente, não mais desejando o vazio que apossa sobre vós.
Abram então este livro e busquem minhas páginas. Não há porque temerem a sombra e a escuridão, pois nem sempre os dias radiantes lá estarão.

Seus olhos erguiam e vasculhavam aquele local sombrio. Folhas esparramadas pelo chão mostravam o caos no ambiente. Um frio estranho percorria-lhe a espinha e sua mão apertava ao redor da alça da lamparina. A luz se espalhava temerosa, pois as sombras pareciam rasgá-la impiedosas e por um momento o mundo girou forçando os olhos fecharem em tamanho temor.

Lembranças invadiam seu coração e o suave arranhar sobre uma folha fizera-o girar e erguer a lamparina. Sua respiração acelerada entrecortava-se de vez em quando e ela estava ali. Tudo estava ali na mais perfeita ordem. Nem mesma a escuridão parecia rodeá-lo.

Ela escrevia uma carta.
O semblante entristecido e a dor naqueles olhos tornavam-na bela, única. E sua mão trêmula por vezes deixava as gotas negras caírem sobre a folha, formando lágrimas diferenciadas.

Não se preocupava em amassar a folha borrada, nem mesmo parar a escrita por aquela pequena mancha e por vezes se erguia, largando a pena sobre a folha que lhe parecia ingrata. Respirava fundo com a mão trêmula, deixando as lágrimas lhe encherem os olhos. Ah! Como eram belas aquelas safiras azuis que enfeitavam aquele olhar que tão distante estava ao observar os prados que rodeavam a casa.

Tiros disparados estremeciam-lhe o corpo e não mais ela se encontrava à sua frente. O mundo girara violentamente. Sentiu vontade de cair de joelhos. Erguia mais uma vez a lamparina, lançando luz sobre a escuridão. Um grito infante lançava desespero em seu coração. As pernas pesavam e gritou apavorado ao notar que as chamas da lamparina se espalharam ao casco de um navio. As pessoas não o escutavam e seu coração apertava. Madeiras estalavam altas e seu corpo mergulhou nas chamas que se espalhavam sobre a água.

Gritou e chorou com seu corpo encharcado, sentindo aqueles corpos dissiparem como sombras. Implorou em tom baixo vendo as folhas esparramadas. Nada mudara. Nada haveria de voltar ao lugar e abraçando fortemente um corpo, pode notar as pequenas cicatrizes naquele rosto.

Uma suave carícia e um suave afagar.
– Não deixe que a escuridão deste lugar tome posse de teu coração.
Apertou o abraço ao redor daquele frágil corpo, sentindo o aperto no coração.
– Eu não pude salvá-la! Eu não pude salvá-la!
Um suspiro fraco e aquelas safiras tão opacas pareciam enxergar muito mais do que nas épocas que escrevia cartas.
– Como poderá salvá-la se não desejas salvar a ti mesmo?