Minha Rainha ria e se divertia, mas havia algo extremamente sedutor em seu sarcasmo e sua diversão. O sadismo presente em seu olhar, em sua majestade de quem desafia, parecia manipular as trilhas por onde quer que nossoa aventureiro passasse. Não iria dar trilhas fáceis, pois árduos caminhos é que fazem plebeus tornarem algo mais. Não que minhas palavras dêm falsas esperanças, pois não sou como meu irmão Tyr Quentalë que a pintava extremamente frágil e uma mulher fácil de enganar e tolos são aqueles que um dia chegaram a pensar que minha Rainha era uma mocinha indefesa.
A ardil e infames pensamentos desses tolos, pois mal sabem a verdadeira natureza que encontraram em suas vidas infantes.

Ri, tal qual a Rainha riu. Um riso capaz de abalar as estruturas dos mais determinados homens que pensavam que haviam tocado o coração enegrecido da fada misteriosa. Os elfos punham-se ao lado da Rainha, em seus murmurares baixos que a mantinha concentrada no aventureiro que desviara-se do centro do labirinto. Talvez o centro deste reino pudesse vir a ser a salvação ou o caminho mais certo para que um dia ele retornasse ao lar de sua sanidade. Os espinhos sedentos de sangue sussurravam feitiços, dizendo ao andarilho que ela brinca e estimula os corações partidos. Mas em seus jogos de manipulações, talvez sejam os cavaleiros que não compreendam que a Rainha dá vários avisos e que não há espaços mais para sentimentos.

— Tolos eles insistem, mas não pela tolice de ver um coração alquebrado, ou por ver alguém que deve ser resgatado. Saiba andarilho, que tem veias de um bardo, a Rainha possui uma alma solitária, enegrecida pelas águas do abismo. Partes dela se encontram por todas as partes e já vi tantos elouquecerem, quanto sairem vazios do reino que o rodeia neste momento.

Pousei por um tempo para ver se o andarilho, ainda buscava pelas plumas negras que eu deixava pelos caminhos. Um truque funesto para fazê-lo conhecer os reinos doentios que nela habitam.

— Muitos ventos tentarão alertá-lo, marcando os terrenos já pisados. Mas talvez seja para seu próprio bem, ou quem sabe para devorarem seu coração.
Ela sorria, com os olhos sombrios a luzir.

— Escute o corvo, cavaleiro…
Ela murmurou pelo meu bico em um sibilar tão traiçoeiro que não deixava de encantar. Sabiamente a Rainha sabia que eu, o corvo, já vivia e que em breve o peregrino surgiria.

Minhas páginas ganhavam mais vida em meio ao sadismo da transição de dois reinos. Transição? Tolo seria se eu pensasse desse jeito, pois estaria agindo como meu irmão. A Rainha por um momento olhou-me com carinho, deixando deslizar seus delicados dedos em minha capa.

— Jamais tema meus pensamentos, Seanchaí!