O sangue dele gelara ao ouvir aquelas palavras murmuradas no último sopro de vida da Senhora O’Reilly.

– Oh! Meu Deus… O que eu fiz?

Murmurava deitando o corpo falecido e desfigurado daquela senhora ao chão. Tinha em suas mãos o sangue daquela mulher. Tinha a julgado quando ela alegava inocência. Mas se não era ela quem estava sumindo com as crianças, o que teria acontecido com as crianças desaparecidas? E por que tantos dentes guardados em potes de barros?

Ele não sabia e quem poderia responder eram seus filhos ou a senhora que tinha acabado de falecer em seus braços. Estava completamente confuso, quando notou o brilho dourado que surgia entre os dedos da senhora.

– Uma moeda de ouro?

Abria com calma os dedos da senhora olhando aquele pequeno círculo dourado, relembrando-se dos momentos que a filha desesperada pedia para que ele ajudasse. Para que ele apagasse o fogo.

– “AJUDE-A!!! AJUDE-A!!! ELA ME DEU ISSO!!! ELA ME DEU ISSO PARA EU AJUDAR VOCÊS!!!”

O coração começava a pulsar forte e suas mãos tremiam com aquele simples símbolo enquanto ele ia se relembrando.

– “Você precisa mais do que nós… Por favor… Fique boa… Fique boa…”

Seus olhos se erguiam na direção de seus filhos. Ele podia ver Fionna chorando com o rosto escondido no corpo do Irmão. Podia ver o filho o observando como se toda a esperança e incompreensão residissem naquele olhar.

– “Eles foram atrás dela… Foram atrás da Senhora das moedas de ouro… Eu falei para Fionna esperar… Falei para ela esperar por você…”

As lágrimas começavam a descer em sua face. Lágrimas derramadas com cada lembrança que retornava. Cada lembrança dura que o consumia em seu sentimento de culpa por ter condenado uma mulher que era inocente em seus atos. Uma mulher que era conhecida como curandeira e que as crianças a adoravam porque…

– O que eu fiz?

As palavras escapavam de seus lábios em um choro que saía desesperado, por se lembrar que as crianças adoravam aquela senhora porque ela trocava os dentes de leite que caíam por moedas de ouro. Um pequeno costume que apenas trazia esperança às crianças de que os dias vindouros seriam melhores. Uma mulher que deu esperança às crianças da vila e que ele tinha acabado de matar a esperança existente em seus inocentes corações e seus filhos mostravam isso a ele que agora abraçava aquele corpo disforme e morto. Seu coração acelerado parecia querer lhe escapar pelos lábios, enquanto as lágrimas derramadas deixavam que a culpa o consumisse. Das lembranças de cada ato cometido contra aquela senhora. Cada horror ao qual ela foi acometida, estraçalhasse sua alma que não soube ouvir tantas vezes o desespero da mulher que dizia não saber onde as crianças estavam, que dizia não saber o que aconteceu com as crianças. Ali em seus braços, debaixo do olhar de todos que o ajudaram em sua cegueira de atos impensados e brutais, Ian gritava em meio às lágrimas, apertando em um forte abraço o corpo falecido da senhora O’Reilly.

– O QUE EU FIZ?