A peça escura movia-se com calma sobre aquelas casas brancas e negras e era repousada diante de tantas outras mais que aguardavam o momento certo. Ele estava pensativo, sereno e belo como sempre.
– Como está tua amiga? – Perguntou-me sem olhar em meus olhos, analisando ainda o movimento que tinha feito, deixando o indicador repousar em seus lábios.
Observava-o pensativa, escolhendo as palavras que iria dizer e pude sentir que ele aguardava a resposta.
– Sempre foste sábia em tuas palavras, jamais foste impulsiva, mas algo tem te incomodado.
Suspirei com aquela constatação, pois ele estava certo e observando a posição das peças respondi de forma calma.
– Ela está bem. O’Toole também está bem, mas eles não encerrarão as buscas no local.
Ele erguia seus olhos, fitando minha alma. Ainda me pergunto se as pessoas realmente resistiam àquele olhar.
– Teus olhos te traem, Madeleine. Eles permitem que tuas emoções sejam sondadas, mostrando-nos teu elo fraco.
Respirei fundo. Era impossível manter meus sentimentos tão bem escondidos dele. Não eram apenas meus olhos que me traiam, mas o elo que ambos possuímos um com o outro. Nosso sangue.
Mais passos e pude observar outros olhares. Olhares mais sagazes e até mesmo mais traiçoeiros. Três pessoas mais chegavam. Uma sorrindo e fazendo um breve meneio cortês com a cabeça, o outro se aproximando, beijando-me a cabeça e bagunçando um pouco meus cabelos e o outro passando batido, acendendo um cigarro e se colocando ao piano.
– Cinzas, Cinzas, nós todos voltaremos. – murmurou o terceiro que chegara, fazendo um sorriso surgir naquele que se encontrava à minha frente e aos outros dois que me cumprimentaram.
– Sabes que não podes ficar interferindo o tempo inteiro, Madeleine.
A conversa voltava, me fazendo perceber que eu estava em xeque no tabuleiro. Não podia ser… Eu havia feito o movimento correto e ele me olhava novamente. Sabia pelo seu olhar que ele me censurava pelo simples fato de ter pensando que ele trapaceara.
– Ela é minha amiga. Uma das poucas que possuo. e Você também não poderia ficar interferindo.
Um riso baixo vinha dos outros dois.
– Ela o colocou em xeque, irmão. – Respondiam em uníssono, conseguindo fazer meu pai sorrir e olhar para mim.
– Um dia compreenderá, Madeleine, que entre pais e filhos, a figura muda de sentido.
O som das teclas do pianos se pronunciam, no que parecia uma insatisfação e pude perceber o rapaz que estava lá se erguendo e saindo da mesma forma que entrou, murmurando em tom baixo:
– Xeque-mate!