Thorn sabia que algo havia acontecido, pois sabia o que acontecia quando eu sonhava, mas o necromante tentava se manter calado perante a situação, conseguindo afastar um pouco o seu corpo de minha pessoa e pegando um lenço para limpar aquele pequeno fio de sangue que escapou de meus lábios.
– Eu preciso ir…
Thorn suspira, sabia que não poderia me prender por muito mais tempo por lá sob sua constante vigilância e então só pode me ver erguer da cadeira, vestir meu casaco e prender a espada à cintura. Por mais que ele quisesse interferir, o necromante sabia que eu estava apenas seguindo ordens ou seguindo o meu destino. Ele abria a porta, para que eu fosse embora e pude escutar aquele suspiro que escapava dele. Cheguei a pensar em parar meus passos, mas a única coisa que eu fiz, foi diminuir meus passos, fechar meus punhos e abaixar a cabeça, enquanto descia as escadas. Nem mesmo olhei para trás, assim como sei que Thorn não ergueria o olhar dele, para ver meu carro se afastando e deixando uma nuvem de barro para trás.
Quando se vive demais ao lado de Togarini, deixamos para trás coisas boas por saber que será melhor assim.
O necromante entrou em sua casa e por muito tempo ficou tentado em usar o telefone para avisar Jean sobre a minha partida, mas a tentação não foi forte o suficiente para ele.
Meu carro cruzava aqueles pântanos de Nova Orleans, eu não conseguia deixar de pensar no sonho que eu tive. Nenhum demônio vagava sobre a terra e isso ficou claro, pois encontrei Thorn inteiro e não havia nenhum sinal de batalha na casa dele.
– Foi um aviso… – Murmurei, tentando manter meu carro naquelas pistas, antes que eu resolvesse tomar um café junto aos crocodilos.
Não sei quanto tempo fiquei rondando nos pântanos, pensando sobre o sonho e como dizer a Alec o que eu teria que dizer, mas o sol já se encontrava naquele tom laranja, quase avermelhado, buscando o descanso abaixo da linha do horizonte. Parei meu carro finalmente à frente daquele bar e puxei um cigarro do meu bolso para fumá-lo, enquanto eu tentava por a minha mente em ordem.
– Alice?
Pude escutar aquela pergunta que vinha de forma baixa, como se surpreso por estar me vendo por ali, assim como pude sentir o meu cigarro sendo tomado de minhas mãos. Eu não sabia se xingava o Alec, apenas para desvencilhar as minhas idéias sobre nossa futura conversa, ou se puxava outro cigarro na teimosia.
– Está tudo bem?
Por que ele tinha que perguntar uma coisa que ele já sabia a resposta? Eu sabia que ele estava sentindo a minha confusão, pois eu o sentia confuso. As coisas não estavam bem…
– Onde está a Júlia?
Alec suspira por um momento, notando que eu não o olharia nos olhos e que algo estava me incomodando.
– Está em nossa casa com o bebê. Não se preocupe. Nada poderá acontecer de ruim… Ninguém conseguirá se aproximar deles dois.
Alec pode sentir o cheiro de um cigarro queimando e então rosna um pouco. Ele sabia que eu tinha que falar algo, mas também sabia que era algo que iria o incomodar mais do que ele estava incomodado.
– Terei que matar o bebê… – Minhas palavras surgiram tão naturais e falei com tanta tranqüilidade aparente que aquilo foi o estopim para fazer meu irmão me pegar pela gola de meu capote, me erguer e me bater contra o meu carro. Eu pude notar aqueles olhos mudando de cor, pude notar as veias começarem a saltar, enquanto bombeavam o sangue de forma apressada e Alec pode apenas sentir a fumaça sendo solta em seu rosto, a qual eu havia deixado presa em meus pulmões mesmo sofrendo aquele choque contra a lataria blindada do Jaguar.
– O que é isso Alice, hã? Será que sua vida com aqueles macacos pelados tirou tudo que você poderia sentir por outras pessoas? Será que você não sabe mais o que é sentir algo? Que prazer é esse que você tem em matar as pessoas? Será que eu terei que a matar, para atender as suas preces? Como pode haver tamanha crueldade em seu coração? Por que você não deixou a criança morrer naquele momento? Precisava trazer a criança a vida, me fazer sentir feliz porque meu filho não nasceu amaldiçoado, apenas para dizer que vai matar o meu filho.. O seu sobrinho, Alice?
Deixei ele explodir, o que mais eu poderia fazer? Acreditar que ele aceitaria de bom grado e fala-se: Tudo bem… é só seguir a trilha de tijolos dourados!
– Espero que você me escute e espero que você me escute muito bem. A criança não é uma criança normal. Jamais será, pois ela deveria estar morta e eu a trouxe de volta a vida com a ajuda de bons amigos. Mas bancar Deus nunca é uma boa, pois se fosse.. Lúcifer não teria sido expulso do paraíso e nem mesmo outros tantos que concordaram com ele. Alguém precisa morrer, Alec. Interferimos no ciclo natural das coisas. Um dos que Interferiram precisa morrer junto com a criança.
– Mas, ele é uma criança normal, Alice… – Rosnava confuso para mim.
– Até ele ser corrompido, e se ele for corrompido a Guerra que houve no paraíso será filme de criança com o que poderá acontecer aqui. E eu não posso permitir que você morra. Não posso permitir que as unicas pessoas com quem me importo morram. Se for necessário… Eu morro junto com a criança.
Alec me soltou ao escutar aquelas palavras. Em nenhum momento ele me viu alterar a voz, em nenhum momento ele sentiu o calafrio aumentar em sua alma, ele sentia um aperto em seu coração e sabia que eu estava falando sério sobre meu sacrifício.
– Não… Eu… mesmo farei isso…
Alec não compreendia meus motivos, jamais compreenderia minhas razões e antes mesmo que eu pudesse dizer a ele o porque de tudo aquilo, Júlia nos interrompia.
– Olá Alice! Oi amor! Estou interrompendo algo?
Alec tentava disfarçar um pouco e eu apenas continuava o meu cigarro, mas havia algo estranho no quadro e eu não pude deixar de perguntar a vampira.
– Aonde está o bebê?