Ainda relia aquele pequeno bilhete em minhas mãos. Aquelas letras tão bem desenhadas mostravam a delicadeza existente na pessoa que escrevia, mas Alice sempre comentou que nas almas mais belas, é que se encontravam os maiores problemas.
Dizia-me isso, toda vez que eu comentava sobre meu fascínio por ela. Em meu “nervosismo” sempre ficava parecendo que eu mais fazia para espetá-la e tirá-la do sério do que ter alguma seriedade de minha parte.
Bom…
Talvez eu realmente seja fascinado por ela, mas às vezes odeio quando Thorn me questiona se é um sentimento verdadeiro ou se é a síndrome do Principe Encantado tentando salvar a mocinha.
Não que eu tenha ciúmes do necromante que a conhece há mais tempo do que eu, ou pelo fato de parecer que ele e a Alice são telepatas com aquelas trocas de olhares entre eles.
Não.. Eu não tenho ciúmes ou inveja ou…
– Fique atento O’Toole.
Meus devaneios foram cortados com um balde de água gelada devido àquela fala de tom baixo de quem sequer olhava para trás. Tudo bem que eu estava um pouco distraído, com aquela carta de letras tão bem desenhadas, pensando em tantas outras coisas, pulando para o que mais me assombra os pensamentos…
– Não seria melhor esperar o reforço?
Sim. Eu sempre retruco a Alice quando estamos para entrar em uma missão contra um possível demônio e sempre contesto que loucos psicopatas e desejosos de almas não podiam ter tamanha delicadeza em suas letras e cartas manuscritas. Mas, Alice como sempre me respondia da forma que ela sempre me respondia. Entrando na boca do leão com a arma empunhada e os olhos atentos aos eventos e não à razão. Tive apenas tempo de guardar a carta ao bolso e ir às pressas atrás da louca e tão fascinante, Alice.
– Alice? – Busquei minha parceira com murmurares. Tudo estava escuro, mas o local cheirava a corpos pútrefes.
– Alice? – Perguntei mais uma vez e ela não me respondia de forma alguma. Suspirei exasperado, porque ela sempre fazia isso?
– A…
Malditos sejam esses seres infernais, nunca senti tamanha dor em minha vida ao sentir o corpo sendo tacado na parede, tal qual uma bola de squash. A arma caiu ao chão. As costelas, ombro e todo meu lado direito doia. A cabeça girava, a visão começava a escurecer e a única coisa que eu conseguia dizer foi…
– A…li..ce…
Pude escutar rugidos, sons de tiro, som de espada batendo em algo sólido. Pude sentir minhas forças querendo me abandonar. Invocações sendo feitas, mais sons de tiros, de batalhas, mas o que realmente me deixou preocupado, quando comecei a erguer o meu corpo e minha visão voltava ainda meio desfocada, foi ver, não Alice com seu olhar furioso empunhando sua espada, mas Madeleine Noveau, empunhando uma espada semelhante, fitando aos olhos do que parecia ser um demônio que incrédulo. O local inteiro começava a desabar. Aquelas duas figuras pareciam imagem de uma foto grudada em minha mente, até um arrepio intenso me fazer olhar para um canto.
– ALICE! – Gritei em desespero, correndo com as parcas forças que tinha, deixando meu rastro de sangue pelo caminho, caindo de joelhos ao chão para tentar erguê-la. Mais uma vez ferida. Extremamente ferida e o som…
– ESTÃO AQUI!!!
Gritos, escuridão, vozes agitadas, imobilizações…

“Os Agentes do F.B.I. sobreviveram após o desabamento de um prédio. O Serial Killer que perseguiam, morreu durante o acidente. A cidade de Nova Orleans agradece aos esforços desses agentes que deram fim a um dos casos que vinha assombrando os turistas…”

– Da Alice eu até espero um comportamento suicida, mas do O’Toole, eu jamais esperaria isso.
Aquela voz… Como aquela voz me incomodava. Ainda mais porque o maldito Thorn estava certo, mas eu não deixaria barato.
– Eu precisava salvá-la… – Murmurei desgostoso, sentindo dores no corpo inteiro, sabendo que estava em uma maca… Mas com certeza não estaríamos em um hospital… Não por conta de Alice. E se não sou eu para protegê-la enquanto dorme, quem protegeria a todos nós?
– Sim… Você precisava salvá-la.. Principe Encantado, mas quem salvou vocês dois é uma das pessoas que você odiaria ficar devendo favores…
Odiaria ficar devendo favores? Mas quem? Então veio a lembrança… Sim.. Alice estava caída, extremamente ferida… Madeleine Noveau estava na cena. Tinha atingido o demônio mortalmente.. o Demônio estava…
Por Deus… Os demônios nunca morrem daquele jeito… ele olhava para Noveau.. Incrédulo.. Não havia ódio naquele olhar… apenas.. incredulidade…