Jean me olhava de cima a baixo. Era claro que ele estava furioso, decepcionado e preocupado. Eu tinha sumido pela parte da manhã e tinha ficado boa parte da noite sumida. Por mais que eles tentassem me rastrear, eles não haviam conseguido. Eu também tinha os meus truques de desaparecimento quando queria.
– Afinal, Alice… O que você deseja? Morrer? Você estava se recuperando, não recebeu alta do hospital, sabe-se lá Deus aonde você se meteu…
– Você sabe que Ele abandonou tudo…
Jean não era de perder a calma, mas ele sabia do que eu estava falando e a citação do Divino não iria mudar a minha opinião a respeito de estar pronta para outra missão suicida ou não.
– Não me venha com gracinhas, Alice. Eu procurei você. Tive que escutar o nosso chefe furioso e a diretoria do F.B.I. perguntando como diabos eu perdia uma agente e não conseguia encontrá-la.
– Você sabe que o “Diabo” em pessoa foi atrás D’Ele…
Por um momento pensei que ele perderia as estribeiras. Vi o rosto de Jean ficar subitamente vermelho, pois eu sabia que ele odiava quando eu cortava o assunto daquela forma. Quando eu achei que ele ía gritar, perder a compostura, o que quer que seja… O rosto dele voltou às tonalidades normais e ele sorriu.
– Certo… Creio que você foi atrás do Lycan e da Vampira para resolver tudo. – Suspirou e manteve o sorriso em uma calma que chegava a irritar. Sempre odiei este auto-controle do Jean. Odeio e admiro em certo ponto.
– Apenas atrás do Lycan desta vez.
Jean me olhou por um longo tempo. Ele me conhecia, sabia que eu tinha feito mais do que ir atrás do Lycan.
– Você sabe que eles são uma ameaça para a humanidade, Alice.
– Não…
Jean me olhou depois daquele não. Um não curto, mas que por um breve momento mostrou mais do que deveria.
– Você sabe que pode confiar em mim, Alice. Sempre pode.
E ele estava certo. Haviam poucas pessoas que eu podia confiar e Jean estava neste pequeno e seleto grupo.
– Alecsander Lupin…
Jean por um momento sente um calafrio percorrer o seu corpo. Algo nele começava a compreender toda a sombriedade da missão.
– É meu irmão.
Aquilo caía como uma bomba. Então o irmão dela havia ressurgido? Isso ficava claro na expressão de Jean que agora tentava buscar as palavras certas para dizer a minha pessoa. Pude vê-lo coçando a nuca por um tempo.
– Mas a vampira…
– Namorada do meu irmão…
Outra bomba e Jean começou a massagear a fronte. A missão estava comprometida, completamente comprometida e batia justamente de frente comigo.
– Sei que meu irmão consegue controlar a namorada dele. Sei que eles podem se manter entre a humanidade sem ser um perigo para os cordeiros D’Ele.
– Alice… Espera…
Eu sabia o que ele iria dizer. Ele iria dizer que eu estava sendo levada pelas minhas emoções e o pior era que ele estava certo.
– Eu sei o que você irá dizer Jean, mas ele é meu irmão. Um irmão que eu achei que era parte de um delírio por conta da quantidade de remédios que eu tomo.
– Você sabe que estes remédios são necessários…
Agora era a vez dele querer bancar o frio comigo, querer justificar tudo e o porquê eu seguia a vida daquela forma.
– Eu poderia simplesmente virar as costas para Geburah, Jean. Ele me usou. Abusou do direito dele requisitando que eu também fosse avatar dele…
– E se não fosse, Alice? Você estaria viva até hoje? Você teria esta oportunidade de reencontrar o seu irmão? Saber que ele é real e que não passava de um sonho ou um delírio?
Jean apenas escutou o som surdo do bater do meu punho contra a mesa. Me ver fechando os olhos de modo forte e erguer-me com as mãos apoiadas na mesa. Jean pode ver a raiva que eu continha dentro de mim, apenas pelo estremecer do meu corpo e o calafrio enorme que tomava conta do seu corpo inteiro avisando que as coisas tendiam a piorar, mas mesmo assim eu tinha um grande respeito por Jean. Ainda mais que, em momentos como esses, ele apenas colocava a mão no meu ombro e murmurava:
– Não iremos abandoná-la, Alice. Apenas não vá despreparada. Ele pode ser seu irmão, a vampira pode ser sua cunhada, mas lembre-se. Eles acima de tudo não são como eu, você, Thorn ou até mesmo o nosso mal-humorado chefe. Se eles perderem o controle, você poderá morrer. Ou você se esqueceu que você acabou de sair do hospital. Que foi você que chegou no F.B.I. se esvaindo em sangue, completamente desnorteada, porque foi incapaz de lutar contra eles? Porque você deixou suas emoções falarem mais alto!
Xeque-mate! Jean em toda sua calma conseguiu praticamente me derrubar no chão com aquelas palavras. Meus olhos se abriam aos poucos e eu pude ver uma das mãos dele apoiada na mesa, enquanto sentia a outra mão no meu ombro.
– Avise a Anderson…. Eu farei as duas conjurações, Jean.
Jean sorria no fim das contas e apenas pode ver que eu caminhava para a sala de conjurações. Ao menos por 24 horas ele sabia que eu estaria em segurança e ele poderia dizer a Anderson o que estava acontecendo.