As folhas deslizavam ao sabor dos ventos sob seus pés e nem mesmo galhos ousavam tocar sua face. As presas mostravam-se alvas e o sangue negro descia em direção aos três fios de cabelos. Há tempos não sentia o coração pulsar daquela forma. Há tempos não sentia o sabor de uma caçada como aquela. Presas que não seriam derrubadas tão facilmente por estarem atentas aos sinais da Floresta Negra.
Corria, sentindo aquela sede que não saciava, a forme que não abandonava seus dias longos sob as sombras negras, mas seus pensamentos logo se desvencilhavam e a lua prateada deitava seus raios à orla da floresta. Saiu correndo, girando o corpo e deixando os dourados vislumbrarem a negritude que suspirava com o abandonar de uma das suas crias.
– Moça? Não sabes que aquele lugar é maldito? – Falou uma voz preocupada, segurando-a e protegendo-a. Abraçava-a, retirando-a de perto daquelas árvores que pareciam estender seus galhos como enormes garras que queriam pegá-la e sua voz, trêmula e insegura, acaricia os ouvidos de seu herói.
– Eu não tinha idéia. Ah! Foi tão horrível. Aqueles gritos! Aquela dor! – Cobria o rosto, enquanto o balançava. Mas não pode deixar de sentir o estremecer daquele corpo que a protegia e a levava em direção à vila. Eram noites como aquelas que as coisas pareciam ganhar uma sombra tão gratificante nas almas dos homens.
Logo o calor tocou-lhe a pele e vozes animadas contavam sobre as desventuras dos dias que eram gratificadas com boas recompensas de mulheres agradecidas e agraciadas. Cantavam canções sobre as lendas da floresta, de casais amaldiçoados, de crianças desaparecidas e pais sacrificados. Enchiam as histórias de monstros e bruxas, deixando as poucas crianças que ali estavam trêmulas a se esconderem nos braços de seus pais e ela?
Ela apenas trançava algo entre seus dedos, escutando as histórias cantadas pelos bardos, pais, mães e guerreiros.
– Coma! Deve estar faminta e cansada se realmente enfrentara aquele lugar maldito.
O sorriso despontara em seus lábios, enquanto o silêncio se alastrou ao redor dela. Corpos estremeceram, gargantas se secaram e olhos ficaram opacos com uma frase tão simples que poderia ter passado despercebida.
– Você escapou da floresta? – Veio um murmurar fraco e medroso e ela não mais viu as crianças de forma tão aparente. Seus olhos começaram a erguer, passando das mãos para o ensopado que seria apetitoso para a mais desesperada criatura faminta, mas que aos seus olhos não passavam de dejetos. Do ensopado se ergueram em direção às pessoas que ainda sentiam calafrios sem saber ao certo o porquê disso, até alcançarem a porta que se abria trazendo o frio noturno. O sorriso se alargou aos lábios, quando as três irmãs entraram, deslumbrando aquele silêncio sepulcral em um lugar que sempre remeteu alegria e esperanças de um povo que respeitava a floresta e seus perigos.